Entrevista com Cristóvão Dalet

um moço negro que sorri a camera
Cristovão

Cristóvão é um artista benguelense ( alguém de Bengula) em artes plásticas, que começou a pintar quando tinha apenas 14 anos. Começou fazendo bandas desenhadas, inspirado por artistas que ele acostumava a ver na Praia Morena. Quando viu que as pessoas elogiavam o trabalho dele, e até compravam alguns dos seus trabalhos, decidiu continuar. Tive a oportunidade de o entrevista depois de ver o seu trabalho no Facebook.

Não vi bandas desenhadas na sua pagina Facebook… ainda faz?

Não, já passei a fase das bandas desenhadas, que levam muito tempo e já não me interessam muito. Agora me dedico principalmente a pinturas realistas e surrealistas.

Como explicaria a diferença entre realismo e surrealismo?

Uma pintura de três mulheres com cestos na cabeça
As “zungeras”

Através do realismo, pinto algo real e visível, como um rosto ou uma paisagem. Por outra, através do surrealismo tento expressar uma ideia, um sentimento, um sonho, algo que faz parte do imaginário e que tem um significado importante para mim.

Em geral, através dos meus quadros, quero expressar o que sinto dentro de mim, e gosto de pôr algo do meu interior na tela. Para mim, arte é uma mistura de reflexão e imaginação.

Ultimamente, em que tem trabalhado mais?

Ultimamente, gosto de pintar rostos africanos, especialmente dos povos do interior e das mães, porque quero mostrar o que para mim mais representa a cultura africana. Num dos meus últimos quadros, pintei algumas zungueras (as mulheres que vendem na rua), para mostrar o sacrifício que elas fazem diariamente e para encorajar as pessoas a valorizar mais o trabalho delas.

Uma pintura de uma mulher jovem e de uma mais velha que preparam o alimento.
“A ignorancia da juventude”

Qual é um quadro surrealista que tem feito recentemente?

Ultimamente fiz um quadro surrealista chamado “a ignorância da juventude”. O quadro representa uma mãe com uma filha a pisar a fuba, algo que é comum ver nas comunidades rurais.

As pessoas que vivem na cidade perderam a capacidade e a vontade de aprender dos mais velhos, e eu acho que esta è uma das causas do desemprego, já que os jovens não querem mais aprender o trabalho dos pais. Eles, em vez de ver o trabalho feito pelos mais velhos das suas famílias, frequentam a universidade e depois ficam sem trabalho.

Por exemplo, o filho dum sapateiro nem tenta aprender as técnicas do trabalho do pai, e pensa que a escola è o único remédio. E essa é a questão que eu queria transmitir através deste quadro.

Vejo que principalmente utiliza cores vivas nesses quadros…tem uma razão?

Sim, os meus quadros, geralmente, tem cores muitos vivas, como vermelho, amarelo e verde florescente, para dar um ar de alegria. De facto, evito cores mortas, que me dão a sensação de tristeza e de pensamento, que não é o que eu quero transmitir.

Uma pintura de uma mulher com um bebê nas costas
Um retrato feito pelo Cristovão

Como vende os seus quadros?

Principalmente, vendo através do Facebook (link: https://www.facebook.com/Artista-Plástico-Dalet-166789917336902/), onde publico regularmente fotos dos meus quadros. Tenho também construído relações com algumas galerias de Benguela, onde as vezes ponho os meus quadros.

Tem vindo a tentar tornar a sua arte em uma profissão?

Infelizmente não há cursos públicos de artes plásticas em Benguela. Entretanto, tento aumentar o meu conhecimento através da internet, onde vejo trabalhos de artistas, principalmente portugueses e brasileiiros e leio os fascículos deles sobre as técnicas que utilizam.

Quais são os desafios principais que encontra no seu trabalho artístico?

Cristovao trabalhando em uma pintura de instrumentos musicais.
Cristovão ao trabalho

O desafio principal é encontrar os materiais (as tintas, os pincéis, os cavaletes, etc…), porque ultimamente são escassos e caros. Por essa razão, muitos pintores desistiram e começaram a fazer outras coisas.

Outro desafio, é que é mais fácil ver os trabalhos de artistas estrangeiros do que aqueles de artistas angolanos, porque os trabalhos dos artistas angolanos não são muito divulgados. Na realidade, pessoalmente, conheço pouco o trabalho de outros artistas plásticos angolanos, além dos poucos que são ativos a nível de Benguela. As exposições dos demais, geralmente, são de Luanda, e não tenho os meios financeiros para ir até lá para as ver.

Eu, de toda maneira, resisto e sonho em um dia poder fazer uma exposição. Para isso, vou precisar de 15/20 quadros e de um local patrocinado.

Conselho para quem quer começar a pintar: ir ver o trabalho das pessoas que já pintam, conversar com eles, etc. Isto vai acabar o medo.

Escrito por: Caterina Manzi