Entrevista com Bebão Cambaio

Um jovem negro a falar no microfone em quanto abraça uma jovem negra.
Bebão a apresentar uma jovem empreendedora num show dele

Bebão Cambaio é um jovem humorista do Lobito (província de Benguela). Durante a entrevista, tivemos a oportunidade de falar sobre como ele superou suas deficiências, e também porque é que fazer humor em um país que enfrentou uma guerra civil tão recentemente é difícil.

Quando é que o Bebão Cambaio começou a fazer Humor?

No início, eu pertencia a um grupo de teatro que, infelizmente, mais tarde se desfez. Então, cada actor tinha de procurar o que fazer. Eu já tinha aquele bichinho de humor, dentro de mim, não sabia, mas fazia no escutismo e foi ali onde tudo começou. Criamos, dentro do escutismo, o grupo de Patrulha Porto, no qual, eu era o líder desta mesma patrulha. Ali, nós brincávamos, e nas brincadeiras que fazíamos, as pessoas olhavam para mim e diziam: “epa, esse gajo dá jeito para fazer humor”.

Eu acho que já nasci com isto, já era um dom e eu não sabia. Uma vez fui convidado por um moço chamado Milton para actuar uns 5 minutos num bar… Lá, , o pessoal gostou muito. Daí, fui actuando, e nem sabia que o humor dava dinheiro – o meu pagamento era o resto de comida dos clientes que tomavam refeições no bar. Na altura, a gente vivia na zona periférica, então, eu tinha de ter no mínimo 200kz de transporte, porque naquele tempo o taxi era 50kz.

Portanto, foi em 2002 quando tudo começou, mas a carreira como tal, deu um “bum bum” em 2013, quando fui ao acampamento mundial de escutismo, no Canadá. Ganhei o prémio de Messager Of Peace, que significa Mensageiro da Paz, num acampamento mundial que havia quase 80 a 100 países a participarem. Destaquei-me entre mais de 50.000 e tais escuteiros do mundo, e fui considerado, então, como o Mensageiro da Paz para Angola.

Tive um apoio incondicional dos Tunezas, quando me deram a primeira oportunidade de actuar em um grande palco, e daí o barco andou. No ano 2016, fui para Portugal no campeonato de Stand – up Comedies, e ganhei o campeonato. Portanto, faço Humor desde 2002, mas a carreira como tal, é a partir de 2013 para cá.

Bebão, como foi a sua jovinez?

Eu sofri muito bulling na escola por ser deficiente e porque tenho síndrome de down, e tinha de fazer qualquer coisa para me destacar no meio dos colegas. Para além de sofrer bulling, eu tinha problema de paraplexia, ou seja, não conseguia ficar por muito tempo de pé, porque se não, caia logo. Sendo assim, o Teatro e o Escutismo foram pontos de partida para superar tudo isso, aceitando-me primeiro: quem sou eu e como sou? Olhando para minha própria realidade.

Então, comecei por me destacar no colégio, as pessoas começaram a olhar-me diferente, e fazia já muito teatro dentro do colégio. Portanto, em todas as festividades do colégio onde havia o teatro, eu é que dava aula, porque já tinha uma bagagem na matéria. Daí fiquei o estrela do colégio, quando assunto era teatro. Contudo, foi assim que superei as minhas dificuldades e, hoje, eu brinco com os meus problemas.

Quem é a sua fonte de inspiração?

Tenho várias fontes de inspiração no mundo humor, qualquer pessoa que faz humor para mim é uma fonte de inspiração, porque eu acho que fazer humor não é fácil; fazer rir as pessoas não é fácil; nem todos têm este dom. Eu costumo falar que existe humorista, engraçado e parvo, e estas são coisas muito diferentes. O dom foi Deus que nos deu, mas as capacidades nos vamos buscar. Assim, tenho os Tunesas como fonte de inspiração, Calado Show, tenho o Maestro, o Kotingo, tenho vários cá em Angola como fonte de inspiração. Em Portugal, tenho o Fernando Rocha, que é grande e espectaculoso. No Brasil, tenho Toca Valcante.

São pessoas que eu vou buscando e aprendendo todos os dias, e como somos influenciados por aquilo que vemos, então, eu acho que toda pessoa que faz humor é para mim uma fonte de inspiração.

Dentre várias temáticas do Bebão, em palco, quais são as que lhe identificam enquanto humorista?

O stand up é um produto de humor que o humorista fala aquilo que pensa, mas nós humoristas temos uma grande responsabilidade em saber seleccionar o tema, tendo em conta o ambiente. Por exemplo: tenho um show que tem criança, e eu tenho de saber o tipo de tema que vou levar para este tipo de publico.

Hoje em dia, em Angola, um dos temas que faz mexer a sala é falar de sexo, sexo na sua vertente educacional, e não enquanto acto. Num show de adultos, por exemplo, falo de sexo como educação, porque nem todos têm educação sexual. E eu sou muito observador, tudo o que eu vejo e é piada, faço. Nós humoristas temos a responsabilidade de passar o lado positivo do humor, que é a educação.

Que avaliação Bebão faz, a nível de estatuto, ao humor angolano?

O nosso humor é muito pesado, devido o contexto. Hoje, o nosso humor tem a aceitação que tem, porque muitos passaram por frente, que abriram e rasgaram o peito para que hoje as pessoas conseguissem ouvir humor. Num país que viveu guerra como Angola, aparece um humorista com o microfone para fazer rir uma pessoa… eu diria que não é uma tarefa fácil, mas, em função, de muito trabalho de pesquisa- estou a falar dos Tunezas e do Calado Show que revolucionaram o humor angolano – hoje nós humoristas da nova geração temos a oportunidade de ir para os outros países para fazer humor. Então, ha que ter respeito e baixar a cabeça, estender tapete para estes dois monstros de humor nacional que deram muito contributo para o crescimento do humor angolano. Se hoje, nós somos humoristas, é graças a estas duas lendas de humor: os Tunezas e o Calado Show.

Hoje, quais são os desafios que os humoristas angolanos enfrentam para terem sucesso, inclusive o Bêbão?

Não gosto muito de falar de sucesso, porque eu não trabalho para o sucesso. Para mim, o sucesso é algo temporário. Eu sou o primeiro humorista angolano que vive e actua em Benguela e toda Angola conhece, ao contrário da maioria, que vai a Luanda para ir posicionar-se, porque é Luanda o maior mercado de explosão, – não estou a querer dizer que algum dia não vou para Luanda.

Dois jovens a falar em frente duma praia.
Armindo a entrevistar o Bebão

Nós vivemos numa província que é muito difícil ser artista. Benguela não é qualquer província da Angola, eu faço desafio em qualquer artista angolano que vem fazer show aqui em Benguela. Passo até garantir que o primeiro Show vai encher, mas o segundo não e o terceiro já vai desisti. Hoje no centro-sul do País, quando se estiver a falar de humor, falar-se-á do Bêbão Kambaio. Foi um trabalho árduo, porque nunca lutei para fama nem para o sucesso. Eu hoje, sustento-me com o dinheiro do humor, portanto, tenho respeito pelo trabalho que faço. Então, ha que ter necessidade de bloquear fama e sucesso. Sucesso a gente vai tendo em função do trabalho. Contudo, eu estou na estrada do caminho do sucesso!

Quais são os artistas com os quais Bêbão partilhou grandes palcos?

Quase todos os melhores artistas de Angola. Para começar, todos os anos eu partilho o palco com os tunezas, fizemos uma torne no ano passado, assim estamos para fazer dois Mega-shows de humor, cá em Benguela, que vai acontecer em Janeiro de 2019. Já partilhei o palco com Calado Show por várias vezes, com o Kotingo por várias vezes, com Paulo Flores por duas vezes, com Matias Damásio por três vezes, com o Anselmo Raph por duas vezes, com o Yuri da Cunha por duas vezes. No melhor festival da família da Unitel fui o cartaz e já trabalhei com a Unitel por duas vezes. No melhor festival do Rock, organizado, ali, na Catumbela, já participei, aliás, participo em todos festivais que do Rock que ali se organiza. Já partilhei o palco com os Calemas, com a Kataleya, Yola Semedo, é uma excelente pessoa, Ary. E vários destes e outros artistas também já vieram para o meu espectáculo: os Tunezas, Calado Show, Kotingo, o Dabeleza, Filho do Zua, Bruna Tatiana e dentre outros.

Escrito por: Armindo Segunda